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Trânsito Letal: O Avanço Trágico das Mortes no Trânsito em MS

3 JUN 2025 • POR Glenda Melo / Diário do Estado • 15h52
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Mato Grosso do Sul já contabiliza, só em 2025, 114 mortes no trânsito o segundo pior índice em seis anos, segundo dados oficiais da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). O número assusta e reforça uma triste constatação: apesar dos veículos mais modernos e das campanhas educativas cada vez mais frequentes, o comportamento humano segue como a principal causa dessa tragédia cotidiana.

Entre os dias 1º e 25 de maio deste ano, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) registrou 97 acidentes e 14 mortes apenas nas rodovias federais que cortam o Estado. Para a corporação, ultraagens perigosas, uso do celular ao volante, ausência de cinto de segurança e embriaguez são os principais fatores que transformam ruas e estradas em campos de batalha.

E quantas famílias inclusive de Coxim estão chorando neste momento por perder algum ente querido ou amigo pela imprudência de alguns no trânsito?

Mas os efeitos dessa epidemia não se restringem às estatísticas de óbitos: atingem, com força, o já fragilizado sistema de saúde pública. O Hospital Adventista do Pênfigo, referência no atendimento de traumas em Campo Grande, gasta R$ 3 milhões por ano apenas com cirurgias decorrentes de acidentes de trânsito. São, em média, 160 pacientes por mês e um custo de R$ 1.520 por procedimento, despesas bancadas por contratos públicos.

Na Santa Casa, maior hospital de referência do Estado, a situação é ainda mais grave. Operando com um déficit mensal de R$ 13 milhões, a unidade chegou a bloquear a entrada de novos pacientes, diante da falta de insumos cirúrgicos. O cenário de sobrecarga tem dias e horários previsíveis: finais de semana, feriados e festas, quando o número de vítimas do trânsito explode e domina os prontos-socorros.

Enquanto as unidades de saúde contam os prejuízos e istram a superlotação, o poder público ite a ausência de um diagnóstico claro sobre os custos dessa violência. A Secretaria Estadual de Saúde revelou que não realiza qualquer estimativa consolidada sobre os gastos com atendimento a vítimas de acidentes. Já a Prefeitura de Campo Grande sequer respondeu aos pedidos de informação. Em contraste, São Paulo, maior cidade do país, gastou R$ 35 milhões em 2024 com atendimento a vítimas de trânsito; o Sistema Único de Saúde (SUS), R$ 314 milhões em todo o país  números que especialistas apontam como subestimados.

 

Esse abismo entre ações pontuais de conscientização e a realidade brutal das estradas evidencia o que especialistas classificam como um problema enraizado: uma cultura de impunidade e irresponsabilidade social. Como lembrou o filósofo Paul Virilio: “quando você inventa o navio, também inventa o naufrágio”. O automóvel, símbolo de liberdade e progresso, tornou-se também uma arma letal diante da falência ética em seu uso e da fragilidade da regulação pública.

Os dados do Atlas da Violência 2024 confirmam a tendência: entre 2018 e 2023, as mortes por acidentes de trânsito em Mato Grosso do Sul aumentaram 20,9%. O índice revela não apenas falhas individuais, mas um colapso mais amplo de infraestrutura, fiscalização e, sobretudo, de priorização da vida nas políticas públicas.

“O trânsito é um espelho da sociedade”, afirma Renato Campestrini, especialista em segurança viária do Observatório Nacional de Segurança Viária. “Quando vemos esses números, estamos vendo também a falência de um pacto coletivo por civilidade.”

No centro dessa tragédia estão vidas interrompidas e famílias devastadas, mas também um Estado que, ao negligenciar a prevenção e a fiscalização, transfere aos hospitais lotados e mal financiados a fatura de sua omissão.

Mudar esse quadro exige mais do que campanhas publicitárias pontuais em datas simbólicas como o Maio Amarelo. É necessário um compromisso contínuo com investimentos em infraestrutura, fiscalização rigorosa, educação cidadã e políticas públicas que realmente coloquem a dignidade humana e o direito à vida no centro da gestão do trânsito, com isso vidas importantes para todos nós poderão ser preservadas.